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Mesmo assim, quem quiser entender as raízes do que se passa na arte hoje tem que mergulhar nos livros. Tenho falado aqui principalmente de artistas estrangeiros, e como vários leitores reclamaram da falta dos brazucas vou aproveitar o gancho para relembrar, sem qualquer pretensão autoral, alguns aspectos relevantes do desenvolvimento da arte brasileira ao longo do século XX, começando pelo Modernismo, com ênfase nas relação entre a arte e o Estado.
Se, na Europa, o Modernismo nas artes visuais foi o reflexo imediato das mudanças materiais e simbólicas impostas à sociedade pelo desenvolvimento do capitalismo industrial – mudanças que alteravam as próprias percepções do tempo e do espaço e criavam um novo público, burguês, para as artes plásticas – no Brasil a modernidade artística não foi uma conseqüência mecânica de alterações sócio-econômicas, mas do próprio contato de artistas nacionais com as transformações radicais da arte européia, provocando uma vigorosa corrente de renovação.
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Mas existiram diferenças estruturais entre o desenvolvimento do Modernismo europeu, a partir do final do século XIX, e o Modernismo brasileiro, nas primeiras décadas do século XX. Rejeitados pelo sistema acadêmico, os pintores Impressionistas criaram por conta própria novos espaços, novas alianças, novas instituições (como o Salão dos Independentes), nos quais passaram a operar, fora do circuito estabelecido. No Brasil foi diferente: os artistas tentaram ocupar as velhas instituições e transformá-las de dentro, o que explica em parte a nossa mania de achar que a vida cultural tem que passar pela mediação oficial, sem a qual nada se consegue fazer.
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Contraditoriamente, o sistema de ensino das artes continuava privilegiando o academicismo, ou seja, a consolidação do Modernismo não implicou o desmantelamento da Academia, como aconteceu na França. Ao contrário, aqui modernos e acadêmicos coexistiram, o que às vezes resultava em conflitos sérios, como no caso da indignação provocada por Lucio Costa quando, ao assumir a direção da Escola Nacional de Belas-Artes, convidou modernistas para a composição do júri do Salão Nacional: a solução, tipicamente brasileira, foi dividir o Salão em duas seções, uma acadêmica e outra moderna. [Continua]
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