O paradoxal é que as duas operações (dessacralização/sacralização) dependem de um reconhecimento generalizado do que é a arte que se pretende desqualificar. Ou seja, a apropriação cospe no prato em que come, ou melhor, come no prato em que cospe. É um tipo de produção que, pela própria natureza, precisa ser marginal. Quando ela se converte em mainstream, perde completamente o sentido.
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Por exemplo, os surrealistas cansaram de provocar escândalo com a apropriação e combinação de elementos do cotidiano em obras de arte, como o famoso telefone-lagosta de Salvador Dalí. Essas obras só surtiam efeito em oposição a uma arte dominante na qual telefones e lagostas não tinham vez (muito menos juntos): felizmente o movimento surrealista, e antes dele o dadaísmo, eram deliberadamente marginais, isto é, contestavam os valores e as instituições da sociedade. Sua atitude negativa/destrutiva era coerente com suas obras e suas ações: suas idéias correspondiam aos fatos.
Ora, desde os anos 80, a arte pós-moderna brinca de desqualificar o projeto moderno e qualquer tipo de grande arte, mas sem abrir mão das mais convencionais formas de êxito e reconhecimento: a exposição nos grandes museus e galerias, as altas cotações nos leilões, a transformação dos artistas em estrelas. É uma atitude duplamente cínica, primeiro porque é uma arte "de segundo grau", isto é, depende de suas referências para existir; segundo porque, institucionalizados e valorizados, esses artistas continuam posando de outsiders vendendo a imagem romântica da contestação.
1 comment:
eu amava muito o Arnaldo(pai) Block, uma pessoa generosa e linda
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