Não é bem assim. Recentemente, o Governo federal gastou um milhão de euros para mandar dezenas de galerias comerciais e centenas de artistas à Espanha. E os galeristas sequer divulgaram os negócios que foram fechados! Ou seja, viajaram com dinheiro
público para auferir lucros privados. Apenas uma ilustração de que a falta de transparência é uma caracerística típica do mercado de arte no Brasil.
Além do mais, se as pessoas não conhecem esses artistas, não é por culpa do Governo nem da iniciativa privada, mas porque a arte contemporânea não se comunica mais com o público. Com honrosas exceções, é uma grande bobagem, feita para alimentar um sistema especulativo dominado por panelas que se elogiam mutuamente.
Muito mais grave do que a falta de acesso aos artistas que a articulista citou (alguns dos quais aprecio, como o José Damasceno) é não se encontrar exposta no Rio de Janeiro nenhuma obra, por exemplo, do Iberê Camargo e outros artistas deliberadamente ignorados pela turma que ocupa, simbolicamente, o poder - turma para quem a única arte brasileira que conta é aquela que deriva de Lygia Clark e Helio Oiticica. Iberê é pintor, né? Coisa mais fora de moda. Arte mesmo é amarrar uma tartaruga num aspirador de pó e chamar de instalação.
. Ou então repetir procedimentos que artistas americanos fizeram há 30 anos como se fossem grandes novidades - e chamar de intervenção. É o caso dos cartazes o artista Alexandre Vogler está espalhando pelo Rio de Janeiro - una foto de mãos femininas com unhas vermelhas entrelaçadas sobre a vagina, simulando um anúncio de esmalte, com o slogan “Base para unhas frágeis”.
Leio que moradores estão protestando contra o mau gosto da obra, que pretende denunciar o sexismo da publicidade, a fetichização da mulher etc. Pretende também, como sempre, “provocar uma reflexão”. Soa a uma importação bastante atrasada das questões de gênero que artistas americanos(as) exploraram à exaustão décadas atrás.

. Leio, por fim, que conservadores do Museu do Prado contestam que o famoso quadro O Colosso tenha sido pintado por Goya, por volta de 1810. Durante quase 80 anos, o quadro esteve exposto com destaque no museu e era considerado uma dos tesouros da arte espanhola. O Colosso representa um gigante enfurecido que ameaça uma cidade - referência à guerra da independência de Madri, em 1808, como reação à invasão napoleônica.
Seja ou não de Goya, é um quadro que, 200 anos depois de pintado, conserva sua força e seu poder de comunicação com o público. É uma obra permanente, como toda grande arte costumava ambicionar ser.